16/12/2009

"o Velho que lia romances de amor"

(...)

- "Olha, com toda esta confusão já quase me esquecia. Trouxe-t dois livros.
Os olhos do Velho iluminaram-se.
- De amor?
O dentista assentiu.
António José Bolívar Proaño lia romances de amor, e em cada uma das suas viagens o dentista abastecia-o de leitura.
- São tristes? - perguntava o Velho.
- De chorar rios de lágrimas - garantiu o dentista.
- Com pessoas que se amam mesmo?
- Como ninguém nunca amou.
- Sofrem muito?
- Eu quase não consegui suportar - respondia o dentista. Mas o doutos Rubicundo Loachamín não lia romances.
Quando o Velho lhe pediu o favor de lhe trazer leitura, indicando muito claramente as suas preferências - sofrimentos, amores infelizes e desfechos felizes -, o dentista sentiu que estava perante um encargo difícil de cumprir.
O Velho recebeu os livros, examinou as capas e declarou que gostava.

(...)

António José Bolivar sabia ler, mas não escrever.
Lia lentamente, juntando as sílabas, murmurando-as, a meia voz como se as saboreasse, e, quando tinha uma palavra inteira dominada, repetia-a de uma só vez. Depois fazia o mesmo com a frase completa, e dessa maneira se apropriava dos sentimentos e ideias plasmados nas páginas.
Quando havia uma passagem que lhe agradava especialmente, repetia-a muitas vezes, todas as que achasse necessárias para descobrir como a linguagem humana também podia ser bela."


Luís Sepúlveda - o Velho que lia romances de amor

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